O Amor na adolescência é algo inexplicável. Quente e gelado, forte enquanto débil, profícuo e ao mesmo tempo frustrante.
É um furacão que arrebata e devasta todos em seu caminho, pois não há defeito aparente que afaste tal furor, levando os inocentes a experimentar as piores agitações, semelhante a um delicado barco em mar revolto.
E foi assim, como acontece com todos. Ela, menina delicada, cheia de toques e não me toques, criada entre mimos e dengos, numa quinta-feira, véspera de Sexta-feira Santa, sentiu que o novo colega de classe seria o amor da sua vida. Embora com seu interior ardendo nas chamas da repentina paixão, seu corpo congelou quando ele se aproximou e perguntou o que ela pretendia fazer no dia seguinte. Ela disse, com voz embargada, que iria estudar e talvez ir ao parque durante a tarde. Quando ele perguntou se poderiam se encontrar por lá, ela quase fez xixi ali mesmo.
Após uma noite mal dormida e a manhã corroída pela ansiedade, a hora esperada estava se aproximando. Quando olhou no espelho pensou em desistir. Sua pele muito clara, estampava um par de olheiras que denunciavam toda sua aflição. Os cabelos nunca estiveram tão horríveis e quando os juntou segurando na nuca, tomou um susto com o tamanho das suas orelhas.
– Nossa! falou a si mesma. Nunca tinha reparado nestas orelhas de abano...
Não, ela não tinha orelhas de abano, nem mesmo seus cabelos eram horríveis. Mas, o platonismo distorce, cega, cala e deprecia.
Finalmente, após vencer este episódio com ajuda da maquiagem, fixadores e acessórios para os cabelos, já com o tempo na prorrogação, conseguiu escolher a roupa e com apenas cinco minutos de atraso chegou ao local combinado, próximo àquela árvore bicentenária cuja copa florida era a referência do parque.
Como todo gentil cavalheiro, ele já a aguardava no local e veio ao seu encontro. Segurou sua mão, beijou com delicadeza, olhou fixamente em seus olhos e disse:
– Olá!
Pelo estreito vão que restou entre sua garganta e o coração que saltava, mal sussurrou um quase inaudível:
– “Oi!”
Nada mais foi dito, enquanto ele a conduziu até o conforto da sombra sob a arvore, naquela tarde banhada de expectativas e um sol ardente, que soberano reinava.
Apenas se olhavam, lânguida e demoradamente. Vez ou outra um suspiro, enquanto ela se acalmava, absorvendo o acontecer daquele momento. No silêncio podia-se ouvir o farfalhar das folhas pelo vento e o canto dos pássaros, que emprestavam encantamento ao romance.
Subitamente ela sentiu um desconforto, talvez provocado pelo pólen e após dois espirros coçou o nariz. Sentiu que havia alguma coisa provocando a coceira, pegada na região chamada de cruz medial, aquela “paredinha” que separa as duas narinas. Passou disfarçadamente o dorso do indicador pela extremidade da narina e percebeu que havia algo se projetando para fora. Intrigada, juntou o polegar ao dedo em ação, segurou o corpo estranho e puxou lentamente. Aos poucos, veio à luz a maior meleca que ela já havia visto. Era contorcida e de uma mescla de cores, bege e marrom, lembrando aquele doce dois amores, embora nada apetitosa. Parecia impossível que algo assim tivesse se formado em sua narina, sem ela perceber.
Por um instante ficou paralisada, incrédula, olhando para o monstro grudado em seu dedo. Começou a balançar a mão tentando livrar-se do objeto pegajoso que não soltava por nada. Finalmente ela resolveu o problema esfregando o dedo na casca áspera da árvore, deixando o indesejável bem colado e exposto no local onde ela imaginara que seu amado eternizaria este encontro, gravando um par de corações unidos com a flecha do cupido. Quando esta fração de eternidade se desfez, de volta à realidade, constrangida olhou para o príncipe que, estático contemplara toda a cena. Ele estava catatônico, com uma indisfarçável expressão de nojo congelada na face. Aquele olhar de repugnância, iria assombrá-la para o resto da vida. Ele moveu-se às pressas para trás de uma moita de cerca viva, de onde veio um ruído regurgitante, ditando o epitáfio de um romance natimorto.
Sob a luz que banhava a relva, ela observava o príncipe se distanciando, mas sem a indumentária típica destas cenas. Parecia apenas um vulto desnorteado, que havia perdido o futuro, sem sequer levar um sapatinho de cristal.
Segunda feira, após o terceiro dia, quando até as ressurreições são possíveis, ela entrou na sala de aula, sentou-se ao fundo e manteve o rosto escondido entre as páginas de um livro aberto. No intervalo notou que ele não estava na classe. Dias depois ficou sabendo que ele mudara de turno. Apesar do alívio, ficou na memória a imagem lúdica do príncipe fugindo veloz em seu cavalo branco, sob uma capa azul, esvoaçante, resplandecendo no horizonte sob um lindo pôr de sol.
Texto do associado:
Romualdo Vicente de Ramos
Achei muito bom, ......kkkkkk
Não há cupido que sobreviva a um tatu monstro desaforado!😂🤣😂
Ótimo, amor de adolescência é exatamente assim, acaba até por uma roupa fora da moda😂😂